11 de março de 2011

Sobre o argumento geracional


Depois dos apelos à participação cívica da juventude, depois de tanto terem acusado os jovens de indiferença relativamente à política, agora que estes decidem afrontar o situacionismo derrotista e reivindicar o acesso a um emprego e a oportunidades mínimas que lhes permitam, tão sómente, encarar o futuro com um pouco mais de esperança, muitas das vozes que antes lamentavam a alienação de uma geração que nos últimos anos tem andado à deriva, argumentam, agora, cinicamente, contra o protesto dessa "geração à rasca" marcado para amanhã em várias cidades do país, acusando os jovens de apenas quererem eternizar o status da geração passada, isto é, o privilégio de um emprego para a vida.

E enquanto uns, os situacionistas próximos do PS, reagem com displicência procurando desacreditar um protesto que teve origem em segmentos de jovens precários, escolarizados e activistas das redes sociais confrontados com a falta de perspectivas de emprego, outros, os contestatários de esquerda, tratam de canibalizar a onda juvenil em benefício da sua agenda de oposição ao governo, elegendo como bandeira a luta contra a precariedade. Outros, ainda, à direita, dizem compreender as motivações juvenis, e é vê-los, num rodopio, a declarar a sua simpatia pelo movimento contestatário, como se não fossem eles, também, responsáveis pela vulnerabilidade actual dos jovens. Entretanto, no seu discurso de posse, foi o próprio Presidente da República que, num inaudito apelo, pediu aos jovens que «façam ouvir a [sua] voz» e que «mostrem às outras gerações que não se acomodam nem se resignam». E outros, haverá, também, - mas só amanhã o saberemos - que tentarão colar-se ao movimento para acções provocatórias, quem sabe, se «proto-fascistas», contra o sistema.

Diante das distintas subjectividades juvenis e, sobretudo, das distintas motivações políticas, nem todas confessadas, que amanhã confluirão - não sabemos ainda se em número significativo - às manifestações de protesto, talvez o mais sensato para não falharmos, por negligência ou por cinismo, a compreensão do acontecimento, seja, por ora, ficarmo-nos pela sua análise sociológica.

Ora o que a análise sociológica, desde já, nos permite afirmar é que - primeira consideração sociológica - no quadro de crise prolongada que se vem instalando no nosso país, engrossam os contingentes de jovens escolarizados que, sem expectativas de emprego, transitam das escolas e universidades para a condição de vulnerabilidade social e, a não serem tomadas medidas que invertam esta tendência, para a exclusão e dependência familiar prolongada uns e quase «inexistência social» outros. E que -segunda consideração sociológica - estes segmentos de uma juventude escolarizada e precária, e activista das redes sociais, poderão vir a desencadear movimentos de consequências imprevisíveis, quem sabe se promissores, recuperando o lugar de vanguarda que a juventude ocupou, na dialéctica da história, nos idos anos 50 e 60, agora, provavelmente através de uma nova narrativa.

E que - terceira consideração sociológica - o argumento "geracional", assente em critérios etários e culturais, que de momento vai dando consistência ao movimento de protesto, ressurge com uma nova plasticidade, tornando-se flutuante para servir - como nas últimas semanas temos vindo a assistir - a «uma débil sismografia sociológica que tem nos media a sua estação meteorológica», conforme escreveu António Guerreiro na sua crónica na Actual/Expresso, visando inconfessados interesses políticos instalados ou desejosos de instalação ou, numa estratégia de consumo de informação pela informação, ir comendo, como dizia Karl Kraus a propósito do jornalismo do seu tempo, a essência do acontecimento, ficando-se, apenas, pela sua forma.

1 comentário:

  1. ...uma coisa já é certa: a geração que estava dada como desaparecida reapareceu em força! Que as nomenclaturas, as do poder e as que aspiram desesperadamente ao poder, retirem conclusões!

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