4 de março de 2012

Extremamente alto e incrivelmente perto


"Todos os livros são sobre a perda", diz Jonathan Safran Foer, um dos mais promissores escritores norte-americanos, segundo a revista Granta, tal como Nicole Krauss, sua mulher, autora de A história do amor (Dom Quixote). Os livros que W. G. Sebald escreveu, esses são, seguramente, sobre a perda. Livros sobre a consternação do mundo, sobre as ruínas que o nosso tempo vai amontoando. Tijolos sobre tijolos. E ninguém na paisagem desolada. Apenas a literatura para gravar no papel o desvanecimento da História. Num outro registo narrativo, também Jonathan Safran Foer tenta em Extremamente alto e incrivelmente perto, romance reeditado pela Bertrand que vem publicando a obra deste autor norte-americano, uma meditação sobre a perda e sobre o luto num mundo que - literalmente - desabou à sua volta. 

Em Extremamente alto e incrivelmente perto (adaptado ao cinema por Stephen Daldry e protagonizado por Tom Hanks e Sandra Bullock), Oskar é um órfão do 11 de Setembro, "o dia mais triste de todos os tempos": o seu pai desabou com as torres gémeas e com elas também os arquétipos de uma criança que não consegue parar de inventar mundos paralelos; noutra história, contada através das cartas escritas pelos avós, é a paisagem de destruição de Dresden durante a Segunda Guerra Mundial que surge carregada de fantasmas do passado. O que nos poderia levar a Sebald (História natural da destruição) evocando as marcas da destruição de Berlim se o livro de Jonathan Safran sobre a consternação do mundo e sobre o luto do pós 11-S tivesse sido um pouco mais apocalíptico e um pouco menos integrado nos circuitos  comerciais.

Contudo, embora permeável ao sucesso mediático, outra maneira de abordar a questão será considerar Jonathan Safran como um jovem escritor que pega no lastro de uma certa literatura, retraçando a partir daí o que antes já fora traçado de outra forma. De resto, o autor não recusa a influência de Sebald, cuja escrita compara a "um machado afiado". Ou a aproximação à agudeza judaica de Philip Roth do período de O complexo de Portnov (não esquecer que Jonathan Safran é judeu e a sua, ainda, curta obra persegue o lastro dessa herança, reinterpretando-a à luz da actualidade). Ou a inspiração em Bruno Schulz cujo conto "A rua dos crocodilos" serviu de base ao seu mais recente livro A tree of codes, "um livro-objecto que joga com o vazio fisico e com palavras e frases arrancadas do conto". Ou a integração de um sopro surrealista que não destoaria de algumas páginas de Kurt Vonnegut. Ou, talvez, antes de tudo, a auto-referenciação a uma certa arquitectura narrativa que evoca Laurence Stern.

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