Por estes dias em que a Grécia se vê ameaçada pela nova barbárie estrangeira que já acampa junto às suas fronteiras aguardando o seu colapso financeiro e social, recordo o poema "À espera dos bárbaros", do grande poeta helénico do século XX, nascido em Alexandria, Constantino Cavafis (1863-1933), que numa alegoria ao desmoronamento do Império romano, recria uma cidade decadente, com políticos imóveis diante da ameaça estrangeira, preferindo a retórica da submissão à acção mobilizadora.
Revejo as imagens do parlamento grego reunido na noite ateniense em chamas para aprovar novo pacote de medidas de austeridade, mas são, ainda, as palavra de Kavafis que melhor iluminam a noite:
"O que esperamos na ágora reunidos? / É que os bárbaros chegam hoje. / Por que tanta apatia no senado? / Os senadores não legislam mais? / É que os bárbaros chegam hoje. / Que leis hão-de fazer os senadores? / Os bárbaros que chegam as farão. /
Por que o imperador se ergueu tão cedo
/ e de coroa solene se assentou
/ em seu trono, à porta magna da cidade?
/ É que os bárbaros chegam hoje.
/ O nosso imperador conta saudar
/ o chefe deles. Tem pronto para dar-lhe /
um pergaminho no qual estão escritos /
muitos nomes e títulos.
/ Por que hoje os dois cônsules e os pretores /
usam togas de púrpura, bordadas, /
e pulseiras com grandes ametistas /
e anéis com tais brilhantes e esmeraldas? /
Por que hoje empunham bastões tão preciosos
/ de ouro e prata finamente cravejados? /
É que os bárbaros chegam hoje,
/ tais coisas os deslumbram.
/ Por que não vêm os dignos oradores
/ derramar o seu verbo como sempre? /
É que os bárbaros chegam hoje / e aborrecem arengas, eloquências.
/ Por que subitamente esta inquietude?
/ (Que seriedade nas fisionomias!)
/ Por que tão rápido as ruas se esvaziam
/ e todos voltam para casa preocupados? /
Porque é já noite, os bárbaros não vêm / e gente recém-chegada das fronteiras
/ diz que não há mais bárbaros.
/ Sem bárbaros o que será de nós?
/ Ah! eles eram uma solução."
Sem comentários:
Enviar um comentário