10 de agosto de 2009

O síndroma de Bartlebly


Olho para os cartazes eleitorais que apresentam Manuela Ferreira Leite numa postura de braços cruzados e lembro-me, cada vez mais, de Bartleby, o escriturário, o personagem do conto homónimo de Herman Melville que, quando instado a realizar um qualquer trabalho, respondia impreterivelmente «Preferia não o fazer». É que o mesmo se vai passando com a líder do PSD que, sempre que alguém lhe pede um comentário sobre um qualquer episódio político ou que revele qual o seu programa eleitoral, responde, invariavelmente, que preferia não o fazer, numa atitude de exaltação da passividade política que a própria iconologia política (isto é, a sua imagem nos cartazes) vem, agora, corroborar, coincidindo, assim, com a atitude de inactividade discursiva traduzida numa mímica pessoal que já se tornou numa espécie de fórmula expressiva sem autor, logo, também, sem conteúdo.

Trata-se, então, de um estilo, entendido como conjunto de traços formais ou discursivos, algo que tem que ver com o modo inconfessado de fazer qualquer coisa, e não com o que é feito ou dito, ou não dito - que é o que, no caso de MFL, sucede na maioria das situações em que é interpelada pelos jornalistas.

Assim, tendo em conta esse seu catálogo pessoal de instantes fulgurantes de «pulsão negativa ou atracção pelo nada» na política - de que ausência de apresentação de programa eleitoral constitui o grau máximo da inacção discursiva -, a questão que me coloco é se não sofrerá, então, Manuela Ferreira Leite de uma espécie de «síndroma de Bartleby» - noção shandiana que peço emprestada a Enrique Vila-Matas [in Bartleby & Companhia, Assírio & Alvim] e que aplico aqui à política - que a leva a renunciar ao discurso político para melhor esconder a ausência de soluções governativas, numa vertigem de silêncio que visa evitar o compromisso político, preferindo apostar, apenas, na erosão do adversário - isto é, na erosão de Sócrates, cujo discurso prolixo nos trouxe um cansaço imenso - e, por isso, mais exposto à contradição entre a forma e o conteúdo?

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