16 de outubro de 2009

Desaparecidos em trânsito



Desse caminhante solitário que ocupa um lugar muito particular na minha biblioteca de quarto escuro, W. G. Sebald, chega, agora, às livrarias portuguesas, Logis in einem Landhaus (1998) [Hospedagem numa casa de campo] que na edição da Teorema se apresenta com o título de um dos ensaios que integra o livro, O caminhante solitário, belíssima homenagem a outro caminhante solitário, Roberto Walser - seu vizinho no meu quarto escuro, ambos escritores sem qualidades que partiram em trânsito deste mundo, Sebald numa curva de uma estrada de Norwich, num dia de Dezembro de 2001, e Walser, também num dia de Dezembro de 1956, durante um passeio pela neve nos arredores do manicómio de Herisau onde se refugiara para desaparecer – a quem Sebald descreve como um ente querido que aos poucos se vai dissolvendo no ar «suavemente e sem ruído até um reino mais livre», ou como um familiar próximo que lhe recorda o seu avô Josef Egelhofer: «Walser sempre me acompanhou em todos os caminhos. Apenas necessito suspender um dia de trabalho quotidiano, para logo ver meu ao lado, nalgum lugar, [a sua] figura inconfundível […] olhando à sua volta».

3 comentários:

  1. Normalmente buscamos a semelhança: num livro, numa pessoa, em algo a que pretendemos nos dedicar de alguma forma; a isso, que comentei uma vez num outro blog, chamo de paradigma do espelho. Ás vezes um pequeno elo de similaridade já cria uma proximidade tão nítida que parece absurda; noutras vezes o absurdo reside na semelhança tão inacreditavelmente plena. Especialmente com os livros e certos autores, acabo criando esse vínculo, como você também, João, que nos brinda sempre e generosamente com seus excertos de alma. Essa necessidade de companhia com ares de reflexo é apenas para que tenhamos uma confirmação alheia de que SOMOS e HAVEMOS no mundo, uns nos outros, na existência, enfim. Abraços, João.

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  2. Também eu prefiro o termo walsereano "paseante". E li o ensaio sobre Walser na edição da Siruela.

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  3. Carlota, livros, então, que trazem consigo o estigma dos cruzamentos, da enxertia. Livros que engendram novos livros. Às vezes, também, encontros, ainda que virtuais, entre leitores "sem qualidades". Abraço.

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