6 de outubro de 2009

Um Bolaño menor?



À medida que vou lendo Una novelita lumpen de Roberto Bolaño - que comprei, ontem, na Casa del Libro, em Sevilha - mais esta se vai parecendo com um capítulo perdido de Os detectives selvagens, só que - também me vai parecendo - menos conseguido. Mas o que me parece, apesar de tudo, mais evidente, é a semelhança das personagens do bolonhês e do líbio com as de Belano e Lima, já que ambas as parelhas poderiam vagabundear indistintamente entre Roma e Mexico D.F. sem que nos apercebêssemos qual o seu território ficcional de origem. E, tal como em Os detectives selvagens, não há aqui melodrama nem ambição redentora, a não ser a da ilusão de sobrevivência. Existe sim, o prenúncio de um Bolaño que haveríamos de conhecer, depois, em Os detectives selvagens e em 2666: o Bolaño da piedade difusa, das vidas amarguradas, das frustrações veladas, embora tudo seja aqui, ainda, comedido, subtil, sem a desmesura apocalítica dos seus romances póstumos.

Não sei se esta novelita me revelará, no final, um Bolaño menor, mas sei que a vou lendo com a lealdade que Bolaño me merece e que exige que sejamos capazes de distinguir entre as suas obras perfeitas (Estela distante), interessantes (Monsieur Pain), vertiginosas (Os detectives selvagens), monumentais (2666) e esta novelita lumpen que me vai parecendo, talvez, o seu livro menos conseguido. E, seguramente, seria esta a atitude que Bolaño - que desconfiava da unanimidade crítica - exigiria aos seus leitores mais cúmplices. Que o lessem sem contemplações.

5 comentários:

  1. Caro João Ventura: acompanhar as suas microdivagações, sempre brilhantes, por esta linha, assaz indestinta, da grande literatura, é obrigatório. Anseio pela sua análise do recém-chegado Sebald (novo livro na Teorema). Em tempos de Bolaño, creio que é sempre um redobrado prazer voltar ao incomprável Sebald e à sua deriva, geográfica e sentimental, por uma certa europa a caminho do desaparecimento. Um abraço, Rui Cóias

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  2. Caro Rui Cóias, a edição desse novo Sebald é um excelente pretexto para um destes dias perseguir o rasto desse caminhante solitário que neste livro se cruza com o outro caminhante, também solitário, que foi Walser. Tenho a edição francesa de "Logis in einem Landhaus", da qual li, precisamente, o ensaio sobre Sebald. Os seus passos vão cruzar-se num post por vir.

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  3. Em qualquer livraria perto de si, com o título «O caminhante solitário» [Teorema].

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  4. A «Novelita» foi escrita por encargo, tinha que ser em Roma (embora pudesse ser em qualquer «afuera» de grande cidade). O próprio título encerra alguma ironia. Gostei muito do blogue, coincidimos em muitos autores: Walser em primeiro lugar.

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